terça-feira, 18 de março de 2014

“A Carne mais barata do mercado é a carne negra (…)”

Por Monique Lemos
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Duas histórias que não tem aparentemente nenhuma relação, mas que se cruzaram na minha vida. Duas tragédias que em uma semana me chocaram, entristeceram e por fim me fizeram escrever.
Um eu conhecia. Na Baixada Fluminense, um menino de sonhos e de garra, que ainda adolescente, descobriu-se socialista. Pai de família, logo teve que buscar o pão de cada dia para sustentar os seus. Seguiu o caminho de muitos jovens da periferia, a Polícia Militar. Passou num concurso, comemorou. Começou seu trabalho, morreu com um tiro na testa enquanto fazia uma ronda numa comunidade do Rio de Janeiro. Se chamava Leidson.
A outra eu não conheci. Ou talvez tenha conhecido, por que ela simboliza as tantas mulheres negras, que varrem o chão, que limpam as casas e que por serem mulheres, negras e pobres, são invisibilizadas pela sociedade. O nome é Cláudia, estava com 38 e tinha 4 filhos, criava ainda, mais quatro sobrinhos. Dela eu sei pouco, infelizmente, vi por imagens, seu corpo ser arrastado por uma viatura da polícia militar.
Como a “Cacau” e o Leidson se uniram na minha vida? Na culpa.
É meus amigos, podemos nós xingar os policiais – como Leidson, trabalhadores “educados” por um sistema bárbaro de violência e repressão – que arrastaram o corpo da Cláudia, como se eles fossem os culpados, ou como aquela repórter imbecil do SBT, culpar os “marginalzinhos” pela morte do Leidson achando que com isso, nós poderíamos dormir com nossa consciência tranquila de que os culpados serão punidos.
Mas eles não serão, porque a culpa está no sistema.
O que leva esses policiais a agirem como animais é a mesma lógica que vitimou o Leidson, é a Guerra genocida contra o tráfico de drogas. O tráfico e a violência estão intimamente relacionados, mas não como pensam muitos, pelo viés do consumo.
Mais pessoas morrem em decorrência do combate bélico ao tráfico do que em consequência da utilização das drogas, mais pessoas não, mais negros. Mais jovens, negros e pobres, assim como o Leidson, assim com a Cláudia.
Já está claro o erro que é combater um problema de saúde pública com uma política de segurança pública. Mas não é só mudar essa lógica, pois, existe a outra ponta do mesmo problema, e ela chama-se: Polícia Militar.
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A ponta do iceberg para mim, está no que disse o antropólogo Luiz Eduardo Soares[1] é que: “Nunca houve tráfico no Rio senão com a polícia como parceira e, frequentemente, como protagonista. Então não há essa distinção polícia/tráfico: polícia é o tráfico, tráfico é a polícia.”
Ou seja, tráfico e polícia se retroalimentam. Mas essa é só a ponta. O problema da Polícia Militar é mais profundo e está na própria natureza dessa instituição, na sua forma de organização (militar) e claro nas suas práticas de violência já tão conhecidas da periferia.
Em suas origens, ela respondeu a necessidade de se caçar os escravos fugitivos. Ou seja, a polícia no Brasil, nasce para proteger a prática da dominação das classes senhoriais, na sua forma mais desumana, a escravidão.
Essa arquitetura classista é aperfeiçoada na Ditadura Militar. A polícia participa e dirige as maiores violações aos direitos humanos no Brasil. Assim uma instituição cuja função seria, teoricamente, evitar que os direitos dos cidadãos fossem violados, na prática os desrespeitam.
Somos todos culpados, por estes dois jovens, não estarem mais com suas famílias e isso é muito difícil de aceitar. Enquanto só estiverem matando o navio negreiro, talvez nós continuemos com nosso debate moral e hipócrita. Eu, não.
Defender o Fim da Polícia Militar e a Legalização das Drogas!
Pela Cláudia. Pelo Leidson.

Um comentário:

Unknown disse...

Não posso deixar de expressar minha opinião em relação ao comentário: "Defender o Fim da Polícia Militar e a Legalização das Drogas!".

Durante a leitura do texto fui concordando com muitos dos pontos apresentados ali, mas terminá-lo com duas proposições destas é ser radical ao extremo.

Assim como qualquer instituição - seja qual for - haverão pessoas bem e mau intencionadas e isto não foge à PM. O Problema não está na Instituição e sim nas pessoas, acabar com uma e criar ou não uma nova não é solução.

Legalizar as drogas é outra proposição que está longe de ser solução para algo. Realizar tal ação num país onde o consumo de bens supérfluos e drogas lícitas como o álcool, por exemplo, aumenta a cada ano entre a uma juventude alienada é dar um tiro no próprio pé. Antes de lutar por algo, é necessário saber o que há por trás de tal corrente: um dos grandes defensores da descriminalização das drogas, mais especificamente da maconha, é o setor corporativo, que há anos produzem estudos e mais estudos e ver neste mercado um grande potencial para lucrar.

Então qual é a solução?

Descriminalizar drogas, acabar com a Polícia Militar (como ela só existisse para combater o tráfico) e dar carta branca às grandes corporações para comercializá-las? NÃO, está não é solução.

A resposta para a questão é um clichê, mas é a única existente: EDUCAÇÃO.
É com a educação que cada indivíduo toma ciência da sua efetiva participação numa sociedade, numa democracia. É através dela que ele reconhece o seus deveres e obrigações perante aos outros e ao estado e à qualquer outra instituição. A educação é transformadora e sabe porque nossos governantes não querem uma população instruída? “Quanto mais instruído o povo, tanto mais difícil de o governar.” (Tau-te-King, 65)

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